EEEFM VICTÓRIO BRAVIM
ALUNO:
SANDRA APARECIDA MÓDOLO
7º
ANO V02
MEMÓRIAS LITERÁRIAS
Remendos de histórias, costurados
pela saudade
Relembrar o passado me faz encontrar muitas fechaduras
recuperadas pelo levantar do pó... Faz-me abrir cofres e gavetas trancadas pelo
tempo... Relembrar o passado é reencontrar lembranças, costuradas pela saudade,
remendadas na memória Plic... Plic... Plic... O tilintar das agulhas em minhas
mãos remetem-me a reascender momentos únicos, que os anos apagaram e deixaram
para trás. Um momentinho...
Na década de 1950, sempre no clarear do dia, o majestoso
canto do galo resgatava sons e cores roubadas pelo silêncio das noites e dava
vida ao meu aconchegante lugar, pintado de verde e amassado pelo sopro dos
ventos. Canto que adentrava meus ouvidos e me convidava a levantar.
Ir à escola era cansativo, mas preciso. Saía cedo
junto a meus cinco irmãos, admirando as árvores que coloriam o caminho. Os
primeiros raios solares, que substituía a lua, que já sem linha deixara de
bordar estrelas e arremessava-as ao longe, nos aquecia. Sobre a escola, hoje
encontro lembranças que aliviam a sensação da régua de madeira tocando minhas
pequenas mãos que mal traçavam as letras. Lembranças remendadas pelas rugas que
hoje as cobrem. Plic... Plic... Plic... Chegávamos em casa após os estudos cobertos pela
poeira da estrada, mas éramos surpreendidos pela recompensa da mesa farta que
devolvia a alegria estampada em nosso sorriso sujo de coloral.
À tarde, íamos nos refrescar nas águas do Rio Sertão,
que como espelho refletia meus singelos traços de menina. Sua correnteza atraía
nossa curiosidade nos levando a travessuras... Em meio a árvores próximas, era possível
avistar um casebre onde adentrávamos intoxicando o lugar de alegria, pintando
de luz a escuridão com o pincel do suspense... BANANAS!! - Era o grito quando
avistávamos os alimentos de cor amarela, decorados com pontinhos pretos. Degustando
essas frutas, ouvíamos roucos passos que se aproximavam... TRUCTREC... Pelas
frestas a luz do sol refletia o olhar arrogante do Sr. Silva que nos convidava
a dali nos retirarmos. Rapidamente corríamos por entre as árvores aterrorizando
os pássaros com nossa algazarra.
Quando
o pôr do sol desamarrava os laços que seguravam as cores e sons do dia e a lua começava
a bordar estrelas, íamos para casa. O sono chegava de mansinho, sereno... Mas
nem dava muito tempo de sonhar. TLUNC! TLUNC! - Ah! A cesta de costura
resolvera cair novamente.
Solitária,
contemplava à luz de lamparina as tão sofridas mãos de minha mãe trançando
linhas e pregando retalhos. Essa luz revelava a face e o trabalho da sofrida
mulher, que passava as noites em claro, bordando e descosturando as dívidas do
tecido “vida”, para ajudar no sustento da casa. Perdi a conta de quantas vezes
desvirei seu chinelo - crendice da época - para salvar sua vida, pois os dedos
de papai que chocavam contra seu belo rosto deformavam-no. Plic... Plic... Plic...
A rotina continuava a mesma até o dia em que o sol
não aparecera para resgatar nossos sorrisos, pois as nuvens começaram a chorar
intensamente... Lembranças trágicas como raios riscados no céu.
Gravuras de desespero costuradas sobre os idos de
1956 revelaram as águas do Rio Sertão, que tanto nos encantava, como um inimigo.
Ao vermos as plantações, serpeando junto às águas, não mais cristalinas, apagarem
com seu curso nossos sonhos, ficamos sem nenhuma esperança.
Quando a água baixou, o pedaço de chão, no interior
de Marechal Floriano, ES, era completamente diferente daquele que nossos olhos
costumavam admirar. Aquele era um novo lugar, onde com muito
esforço reconstruiria meu futuro e minha história. Plic... Plic... Plic... Cenário
que ainda guardo na lembrança.
Hoje, meus olhos se entristecem ao observar o Rio
Sertão, costurado por histórias e remendado pela poluição. Pequeno
curso de água que um dia mudou minha história, mas que ainda segue construindo
o futuro de Marechal Floriano, furando serras e precipitando lágrimas...
Lágrimas que preenchem os momentos de lembranças resgatadas pelo tempo...
Lágrimas presas aos laços da vitória... Lágrimas que remendam histórias na
memória e costuram saudades com linhas douradas. Plic... Plic... Plic...
Texto baseado na entrevista com Alzita
Roveda Zambom, 80 anos.
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